A empatia é uma qualidade que deve ser cultivada, mas seu excesso pode levar a um quadro de exaustão física e emocional.
A empatia é uma qualidade que deve ser cultivada, mas seu excesso pode levar a um quadro de exaustão física e emocional. A linha que separa a empatia do burnout empático – ou fadiga empática – é muito sutil. Só percebemos que ultrapassamos o nosso limite quando pifamos.
Ser empático é uma característica que nos humaniza. Por muito tempo acreditei que empatia seria a capacidade de se colocar no lugar de outra pessoa. Agora vejo de forma diferente. Cada pessoa é única e é impossível sentir o que o outro sente. Gosto da seguinte definição de empatia: “sentir a expressão da dor ou o prazer do outro como ele o sente e perceber suas causas como ele a percebe, porém sem nunca perder de vista que se trata da dor ou do prazer do outro.”(1)
A síndrome de burnout atinge profissionais das mais diversas áreas, mas a sua face mais visível é a dos que lidam diretamente com a saúde. Quem não se lembra do que ocorreu com eles durante o período da pandemia? Aquelas pessoas conviveram com o drama de pacientes e familiares diariamente e por um longo período. Impotência, medo, angústia foram sentimentos frequentes diante de tanta pressão e que teve efeito na saúde física e mental de muitos deles.
Estudo divulgado em 2022 pela Fiocruz do Matogrosso do Sul e da Fiocruz Brasília feito com 800 trabalhadores das áreas de enfermagem, odontologia, medicina, farmácia e fisioterapia deixa clara a dura realidade desses profissionais. Dos entrevistados, 65% apresentaram sintomas de transtorno de estresse; 61,6% de ansiedade e 61,5% de depressão.
Um universo a ser cuidado
Acredito que os resultados seriam semelhantes se o estudo abrangesse todos os profissionais envolvidos direta ou indiretamente com o cuidar. Já pensou que em instituições hospitalares os faxineiros, porteiros, copeiros e mesmo quem atua na administração também têm contato com o sofrimento humano? Familiares e cuidadores, profissionais ou não, sofrem da mesma forma.
Fiquei surpresa ao descobrir outra categoria de alta carga de estresse e que não é vista: os médico-veterinários. Interessante, não é? Segundo o Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de São Paulo, eles também são suscetíveis ao burnout empático “por lidarem com a morte cinco vezes mais que os demais profissionais da saúde, devido à expectativa de vida de um animal”.
A fadiga empática pode atingir pessoas que desenvolvem trabalhos voluntários também. Faço parte de um projeto que atende pessoas com doenças graves nas favelas da Rocinha e do Vidigal. Nele, contamos com a participação de uma equipe multiprofissional da área da saúde, mas também com moradores que apoiam diretamente àqueles atendidos pelo projeto – seus vizinhos. Vejo a real preocupação dos coordenadores com a saúde física e mental dos voluntários. Todos os meses há um encontro para que os cuidadores sejam cuidados. Massagem, relaxamento e meditação são algumas das atividades oferecidas.
Quem cuida precisa ser cuidado. Profissionais da área da saúde, familiares de pessoas doentes, veterinários, voluntários e cuidadores estão sujeitos ao burnout empático. Estão todos no mesmo barco.
A cura está na compaixão
A doutora Andrea, uma das fundadoras do Colo de Cumaru, escreveu - neste blog - sobre seu encontro com a fadiga empática e sobre como buscou ajuda para lidar com ela. O alívio do sofrimento chegou pela compaixão e pela autocompaixão.
A compaixão vai além da empatia. Identificamos o sofrimento do outro, queremos aliviá-lo e partimos para a ação. Para Thupten Jinpa, ex-monge, tradutor do Dalai Lama, estudioso e difusor do budismo tibetano “a compaixão é o que conecta o sentimento de empatia a atos de bondade, generosidade e outras expressões de nossas tendências altruístas"(2)
“Se a compaixão não inclui a si mesmo, então ela é incompleta.”
Jack Kornfield*
A compaixão nos ensina que não precisamos nos identificar com a dor do outro. Ela nos obriga a olhar para nós mesmo. Se não temos compaixão com a gente, como poderemos ter com as outras pessoas?
Podemos trabalhar e praticar a compaixão e a autocompaixão para que se transforme em uma força ativa em nossa vida. Ao trazer a compaixão para perto, encontramos caminhos para lidar com o burnout empático. Cabe a cada um de nós “colocar a mão na massa”.
Juliana Toscano
Aquela que dá colo
Jornalista
Sentinela - Guardiã de Fim de vida
(1)Experiência empática: da neurociência à espiritualidade, Márcia Alves TassinariI; Wagner Teixeira DurangeII, Revista da Abordagem Gestáltica, vol. 20, n.1, 2014.
(2)Um coração sem medo, Thupten Jinpa, Sextante, 2016.
*Jack Kornfield é um psicólogo norte-americano e um dos responsáveis por introduzir o “mindfulness” no Ocidente.
Livros de Thupten Jinpa (em português e em inglês)
Você pode consultar no site da Amazon
Sugestões de leitura
A semente da compaixão: lições da vida e ensinamentos de Sua Santidade, o Dalai Lama
Dalai Lama
32 páginas
Editora Caminho Suave - 2020
A revolução do altruísmo
Matthieu Ricard
715 páginas
Editora Palas Athena - 2015
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